terça-feira, 26 de maio de 2015

- Toda vez que leio esse texto penso em você.




     Travessuras ( Doidas e Santas) - Martha Medeiros

     O novo livro de Mario Vargas Llosa é uma história de amor que dura uma vida inteira. Tudo começa no verão de 1950, no Peru, quando Ricardo , um rapazote de quinze anos que sonhava em morar em Paris, conhece Lily, uma adolescente com uma personalidade mais do que marcante. Ele se apaixona feito um bezerro, como ele mesmo define.


     O livro conta a trajetória desse amor ora feliz e quase sempre infeliz. Lily some do Peru sem deixar rastro, Ricardo vai morar em Paris e só se reencontram anos depois Ela some de novo e, passado um tempo, ele a reencontra em Londres. Ela desaparece outra vez e ele mais tarde a descobre em Tóquio, onde ela apronta todas e evapora, claro. E ainda mais uma vez se cruzam em Madri, ambos cinquentões. Lily, essa mulher misteriosa que vai trocando de nome e de marido a cada aparição, é uma peste. Tem índole suspeita, hábitos condenáveis e é fria com uma manhã de inverno em São José dos Ausentes. Nem muito bonita é. Faz de Ricardo gato e sapato. Ele resiste? Nem Tenta, pois sabe que não há como. O amor verdadeiro tem destas coisas: não se explica, não se controla, não se racionaliza, simplesmente toma conta. É uma droga, um vício, uma viagem entre o céu e o inferno, ida e volta, sem parar. 

    Vargas Llosa escreveu um livro encantador sob várias aspectos, não só pela original sequência de encontros e desencontros dessa casal instável, mas também por retratar períodos significativos das principais cidades do mundo. E por escrever com mão de pluma, tratando com leveza a angústia humana e com isso dando ao livro um tom novo, sem dramalhão que costuma caracterizar as histórias de amor não resolvidas.

     Outra coisa que me chamou a atenção foi o título, Travessuras da menina má. "Menina Má" é como Ricardo chamava carinhosamente a jararaca, mas o uso do termo "travessuras" é curioso. A mulher que ele ama não é travessa, caramba: é uma bisca. mentirosa, falsa, sem escrúpulos - e fascinante óbvio. Ricardo sabe que ela está a mil léguas da decência, mas seu amor impede que a julgue com a severidade dos adultos. prefere resumir as sacanagens da amada como pequenas travessuras infantis. Só assim poderá perdoá-la a cada reencontro. 

     Travessuras. Quantas mulheres consideram assim as artimanhas dos maridos, quantos pais encaram como travessuras as mentiras e furtos dos filhos, quantos de nós evitam o confronto com a verdade e, em vez de dar o nome certo às coisas, chamam erros graves de "travessuras" para poder perdoar? Aliás, diante do resultado das últimas eleições, ficou confirmado que o eleitorado brasileiro considerou apenas uma travessura o que andou acontecendo nos bastidores do governo. Enxergar a verdade, quando se está apaixonado, nunca foi bom negócio, quem não sabe? Pois parece que anda servindo para política também. Num caso ou no outro, só resta seguir em frente e torcer para que nossa condescendência seja recompensada. 


Página: 114 e 115

Nenhum comentário:

Postar um comentário