sexta-feira, 31 de julho de 2015


Sobre sair para beber sozinha - Amanda Mormito


Há tempos eu saio para beber e viajar sozinha. Tudo começou quando eu cansei de esperar amigas que nunca quiseram sair do estado e namorados que nunca houveram, para daí então poder fazer algo que eu realmente quisesse. Tirei o bandaid e aceitei que adorava ficar um tempo sozinha quando tinha 19 anos e desde então venho fazendo ambos independente de onde more ou de onde visite. Porque conhecer bares e lugares
 diferentes são duas coisas deliciosas, juntas elas ficam perfeitas. Não confunda liberdade pessoal com introversão, por gentileza, durante esse post.
Acontece que não é lá muito comum fazer isso. Esse post era para sair daqui um tempo (quando eu já tivesse abarcado mais álcoois e lugares legais para visitar), mas resolvi publicar antes por motivos de: “não está sendo fácil sair para beber sozinha”. 
Veja bem, não sou uma pessoa que chama atenção: não tenho mais que 1,60m , sou discreta (já cheguei a ir a um mesmo bar 2x na mesma semana durante 2 meses, me sentar no mesmo lugar e ser atendida pelas mesmas pessoas que jamais se lembraram da minha existência, até que um deles notou que eu sempre pedia a mesma coisa – Old Fashioned sempre às quintas) e séria, mas nem isso ajuda na hora de sair para beber sem companhia.
E vamos ao real motivo pelo qual estou abrindo aqui o corazón: qual o problema de uma mulher se sentar sozinha em um bar e pedir algo para tomar?
Dentre as poucas vezes que me atrevi a fazer isso por São Paulo ou fui assediada, ou indaga se não tinha amigos, ou se estava de coração partido e até mesmo se estava caçando (nessas palavras). E surpreendentemente não foram só homens que fizeram isso, muitas mulheres me olharam feio entre as vezes que cheguei sozinha e sai sozinha de um bar.
Pude até ter sido ingênua das primeiras vezes. Morei em uma cidade que isso não era comum também, mas pelo menos as pessoas me respeitavam. Afinal, a vida tá aí pra cada um ser feliz fazendo o que julga coerente e que traz, ainda que seja, um pequeno momento de felicidade. E independente de crenças ou filosofias, você há de concordar comigo que o tempo cada vez passa mais rápido (alguém aí viu Junho passar?).
Eu também não sou dessas que tem medo de cara feia, minha família é italiana (cara feia pra gente é fome), mas uma experiência que poderia ter sido minimamente tranquila e sem maiores desafetos acaba se tornando uma chateação sem fim (qual a necessidade?).
Uma das últimas experiências que tive aqui foi em um restaurante-bar de Pinheiros. O bartender não sabia direito como lidar com o fato de ter uma menina sentada a sua frente sem uma amiga ou alguém a tiracolo, fui sincera e abri o jogo com ele: não se preocupa comigo porque eu adoro ter um tempo sozinha. Até aí eu entendo (sério) e não ligo (muito) de justificar o propósito de estar fazendo aquilo se vai deixar o menino mais tranquilo para me atender e/ou bater um papo descontraído. Mas vamos combinar que eu não precisaria fazer isso.
Mas daí, amigos, apareceu a hostess do lugar. A cidadã me perguntou, acreditem, 3 vezes se eu estava sozinha e se iria ficar sozinha. Não satisfeita, foi para trás do bar, falou com o bartender olhando para mim e ficou me encarando durante o tempo que permaneci no lugar. E ainda ficou desconjurada quando comecei a balançar o pé ao som dos Beatles que tocava como música ambiente por lá. Pelo jeito estava eu infringindo regras.

Quando ela sumiu do mapa e eu jurei que o desconforto houvesse passado, chegou um casal no estabelecimento. Não haviam cadeiras disponíveis para ambos se sentarem a não ser as duas banquetas que estavam ao meu lado. Os dois somente se sentaram quando me afastei um pouco das duas banquetas e inclinei a minha mais em direção a parede. A mulher se sentou ao meu lado e o namorado dela ao lado. Não sei a real intenção e não me julguem se estiver sendo “inocente, não sabe de nada”, mas a menina se sentou de costas para mim. Fiquei constrangida e o bartender, já meu amigo, se sentiu incomodado. Desconcertado, ele até me ofereceu um drink da casa – sem custo e um “desculpa moça, mas não é todo dia que uma garota sai sozinha para beber drinks no meio da tarde”.
A real é que essa foi uma das várias vezes que saí para beber sozinha. Poderia ir a uma livraria, no Ibiraquera ou até mesmo ao cinema, mas o fato de ser um bar tá errado. Eu não ligo para cara fechada e tem bares que são mais ou menos propícios para se fazer isso, mas ser mulher e ir a um bar sozinha ainda é um tabu (tabu ainda mesmo entre nós, mulheres).
Acho um saco ter que ficar me justificando cada vez que alguém me pergunta: tá sozinha por que? Gente, passa pela cabeça de alguém que eu quero ficar no meu canto? Sou dessas que tem preguiça de falar às vezes e adoro observar o movimento ao meu redor. Acho incrível ver pessoas sorrindo ou até mesmo tendo discussões acaloradas e me lembrar de coisas gostosas, é meu jeito de sentir a vida transcorrendo.
Muita gente tem mania de confundir a solidão com tristeza. Foi para o cinema sozinho? Porque ninguém quis ir contigo. Foi jantar sozinho? Coitado, que dó. Foi para o bar beber sozinho? Tá de coração partido. Ou a coisa é inversamente oposta: tá caçando, tá querendo, tá fácil.
Eu fui criada sabendo que ninguém iria realizar meus desejos por mim e que ninguém paga minhas contas no final do dia para julgar se meu dinheiro vai ser melhor gasto em uma bolsa ou em um drink numa quinta-feira de noite, em um bar sozinha.
Sei também que muita gente não gosta dessa exposição, não é lá tão fácil sair sozinha e desfrutar sua própria companhia, mas amigos, por favor, deixem em paz quem consegue/pode fazê-lo.

terça-feira, 28 de julho de 2015


Simples, fácil e comum - Martha Medeiros

Tenho mergulhado numa questão que parece prosaica, mas é de importância vital para melhor conduzirmos os dias: por que as pessoas rejeitam aquilo que é simples, fácil e comum? 

O mundo evolui através de conexões reais: relacionamentos amorosos, relacionamentos profissionais e relacionamentos familiares – basicamente. É através deles que nos enriquecemos, que nossos sonhos são atingidos e que o viver bem é alcançado. No entanto, como nos atrapalhamos com essas relações. Tornamos tudo mais difícil do que o necessário. Estabelecemos um modo de viver que 
privilegia o complicado em detrimento do que é simples. Talvez porque o simples nos pareça frívolo. Quem disse? 

Não temos controle sobre o que pode dar errado, e muita coisa dá: a reação negativa diante dos nossos esforços, o cancelamento de projetos, o desamor, as inundações, as doenças, a falta de dinheiro, as

 
limitações da velhice, o que mais? Sempre há mais. 

Então, justamente por essa longa lista de adversidades que podem ocorrer, torna-se obrigatório facilitar o que depende de nós. É uma ilusão achar que pareceremos sábios e sedutores se nossa vida for um nó cego. Fala-se muito em inteligência emocional, mas poucos discutem o seu oposto: a burrice emocional, que faz com que tantos façam escolhas estapafúrdias a fim de que pelo menos sua estranheza seja reconhecida. 

O simples, o fácil e o comum. Você sabe do que se trata, mas não custa lembrar. 

Ser objetivo e dizer a verdade, em vez de fazer misteriozinhos que só travam a comunicação. Investir no básico (a casa, a alimentação, o trabalho, o estudo) em vez de torrar as economias em extravagâncias que não sedimentam nada. Tratar bem as pessoas, dando-lhes crédito, em vez de brigar à toa. Saber pedir desculpas, esclarecer mal-entendidos e limpar o caminho para o convívio, ao invés de morrer abraçado ao próprio orgulho. Não gastar seu tempo com causas perdidas. 


Unir-se a pessoas do bem. Informar-se previamente sobre o que o aguarda, seja um novo projeto, uma viagem, um concurso público, uma entrevista - preparar-se não tira o gostinho da aventura, só potencializa sua realização. 

Se você sabe que não vai mudar de ideia, diga logo sim ou não, para que enrolar? Cuide do seu amor. Não dê corda para quem você não deseja por perto. Procure ajuda quando precisar. Não chegue atrasado. Não se envergonhe de gostar do que todos gostam: optar por caminhos espinhentos às vezes serve apenas para forçar uma vitimização. O mundo já é cruel o suficiente para ainda procurarmos encrenca e chatice por conta própria. Há outras maneiras de aparecer. 

Temos escolha. De todos os tipos. As boas escolhas são divulgadas. As más escolhas são mais secretas e, por isso, confundidas com autenticidade, fica a impressão de que dificultar a própria vida fará com que o cidadão mereça uma medalha de honra ao mérito ao final da jornada. Quem acredita que o desgaste honra a existência, depois não pode reclamar por ter virado o super-herói de um gibi que ninguém lê.

sábado, 25 de julho de 2015


Felicidade Realista - Martha Medeiros

De norte a sul, de leste a oeste, todo mundo quer ser feliz. Não é tarefa das mais fáceis. A princípio, bastaria ter saúde, dinheiro e amor, o que já é um pacote louvável, mas nossos desejos são ainda mais complexos.
Não basta que a gente esteja sem febre: queremos, além de saúde, ser magérrimos, sarados, irresistíveis. Dinheiro? Não basta termos para pagar o aluguel, a comida e o cinema: queremos a piscina olímpica, a bolsa Louis Vitton e uma temporada num spa cinco estrelas. E quanto ao amor? Ah, o amor… não basta termos alguém com quem podemos conversar, dividir 
uma pizza e fazer sexo de vez em quando. Isso é pensar pequeno: queremos AMOR, todinho maiúsculo. Queremos estar visceralmente apaixonados, queremos ser surpreendidos por declarações e presentes inesperados, queremos jantar à luz de velas de segunda a domingo, queremos sexo selvagem e diário, queremos ser felizes assim e não de outro jeito.
É o que dá ver tanta televisão. Simplesmente esquecemos de tentar ser felizes de uma forma mais realista. Por que só podemos ser felizes formando um par, e não como ímpares? Ter um parceiro constante não é sinônimo de felicidade, a não ser que seja a felicidade de estar correspondendo às expectativas da sociedade, mas isso é outro assunto. Você pode ser feliz solteiro, feliz com uns romances ocasionais, feliz com três parceiros, feliz sem nenhum. Não existe amor minúsculo, principalmente quando se trata de amor-próprio.
Dinheiro é uma benção. Quem tem, precisa aproveitá-lo, gastá-lo, usufruí-lo. Não perder tempo juntando, juntando, juntando. Apenas o suficiente para se sentir seguro, mas não aprisionado. E se a gente tem pouco, é com este pouco que vai tentar segurar a onda, buscando coisas que saiam de graça, como um pouco de humor, um pouco de fé e um pouco de criatividade.
Ser feliz de uma forma realista é fazer o possível e aceitar o improvável. Fazer exercícios sem almejar passarelas, trabalhar sem almejar o estrelato, amar sem almejar o eterno. Olhe para o relógio: hora de acordar. É importante pensar-se ao extremo, buscar lá dentro o que nos mobiliza, instiga e conduz, mas sem exigir-se desumanamente. A vida não é um game onde só quem testa seus limites é que leva o prêmio. Não sejamos vítimas ingênuas desta tal competitividade. Se a meta está alta demais, reduza-a. Se você não está de acordo com as regras, demita-se. Invente seu próprio jogo.”

segunda-feira, 20 de julho de 2015

Sabe o ódio que espalhamos por aí? 
 Daqui a pouco ele volta. 
Bem na cara de um de nós, de um dos nossos.



     Ódio é ódio, minha gente. Amarrar a um poste um suspeito de assalto e surrá-lo até a morte é exercitar o mesmo ódio que um assassino põe em prática ao tirar a vida de um trabalhador no ponto de ônibus. É dar cabo da mesma fúria de um covarde que espanca a mulher em casa. Quem toma parte de um linchamento utiliza o mesmo recurso de um bandido medonho que amarra uma corda ao pescoço de um cachorrinho e o asfixia para divulgar a foto nas redes sociais.
     É o mesmo ódio. Sob outra forma, distribui a mesma raiva levada adiante por quem ofende uma pessoa por sua cor, seu credo, sua origem social e sua opção sexual. Tem a mesma sanha de ataque e a velha falta de critério e estratégia dos que pensam mirar insultos a um partido político e acabam atirando descaradamente contra o resto do mundo, contra a decência, o respeito, a inteligência. É ódio, minha gente! Distribuir ódio por aí, sob qualquer forma, virou a coisa mais fácil e banal do mundo.
     Estamos borrifando maldade sem nos darmos conta! E daqui a pouco ela volta. Volta na cara de um de nós, de um dos nossos, sob a forma de um insulto gratuito, uma paulada, uma bala perdida. Porque insistimos, nós, os “cidadãos de bem”, em praticar o mesmo ódio dos facínoras. E antes que alguém me diga com expressão superior: “você está generalizando, menino!”, eu respondo — ódio é ódio em qualquer lugar, sob qualquer dose, com qualquer pretexto. Venha do imbecil que ofende uma jornalista negra, do “militante político” que pede a morte de um “adversário” pelo facebook, do criminoso que assalta e mata, de um justiceiro que espanca e executa um acusado na rua ou do desavisado que aplaude uma barbaridade.
     Pensemos. E, por favor, miremos nossas reflexões para além do simples e fácil “você está defendendo bandido”. Nós podemos mais do que isso.

sábado, 18 de julho de 2015

Gregório Duvivier - Não quer ajudar, não atrapalha



     É sempre a mesma coisa. Primeiro todo o mundo põe um filtro arco-íris no avatar. Depois vem uma onda de gente criticando quem trocou o avatar. Depois vem a onda criticando quem criticou. Em seguida começam a criticar quem criticou os que criticaram. Nesse momento já começaram as ofensas pessoais e já se esqueceu o porquê de ter trocado o avatar, ou trocado o nome para guarani kayowá, ou abraçado qualquer outra causa.
     Toda batalha pode ser ridicularizada. Você é contra a homofobia: essa bandeira é fácil, quero ver levantar bandeira contra a transfobia. Você é contra a transfobia: estatisticamente a transfobia afeta muito pouca gente se comparada ao machismo. Você é contra o machismo: mas a mulher está muito mais incluída na sociedade do que os negros. E por aí vai. Você é de esquerda, mas não doa pros pobres? Hipócrita. Ah, você doa pros pobres? Populista. Culpado. Assistencialista.
     Cintia Suzuki resumiu bem: “Você coloca um avatar coloridinho, aí não pode porque tem gente passando fome. Aí o governo faz um programa pras pessoas não passarem mais fome, e aí não pode porque é sustentar vagabundo (…). Moral da história: deixa os outros ajudarem quem bem entenderem, já que você não vai ajudar ninguém”.
     Todo vegetariano diz que a parte difícil de não comer carne não é não comer carne. Chato mesmo é aguentar a reação dos carnívoros: “De onde você tira a proteína? Você tem pena de bicho? Mas de rúcula você não tem pena? E das pessoas que colhem a rúcula, você não tem pena? E dos peruanos que não podem mais comprar quinoa e estão morrendo de fome?”
     O estranho é que, independentemente da sua orientação em relação à carne, não há quem não concorde que o vegetarianismo seria melhor para o mundo, seja do ponto de vista dos animais, ou do meio ambiente, ou da saúde, ou de tudo junto.
     O problema é exatamente esse: alguém fazendo alguma coisa lembra a gente de que a gente não está fazendo nada. Quando o vizinho separa o lixo, você se sente mal por não separar. A solução? Xingar o vizinho, esse hipócrita que separa o lixo, mas fuma cigarro. Assim é fácil, vizinho.
     Quem não faz nada pra mudar o mundo está sempre muito empenhado em provar que a pessoa que faz alguma coisa está errada —melhor seria se usasse essa energia para tentar mudar, de fato, alguma coisa. Como diria minha avó: não quer ajudar, não atrapalha.

quinta-feira, 9 de julho de 2015


Cartas sobre o amor próprio - Dani Lusa

Ela:
Sinto-me desfeita. Você não acha que já tirou muito de mim? Meus sonhos, meus planos, meus carinhos, meus beijos, meus pensamentos, eu. O que mais pode querer? Tem noção do quão difícil é se reconstruir, juntar cada parte outra vez, refazer o que o desamor desfez? Não, não responda. Você não sabe, é claro que não sabe. Aliás, nunca soube de nada em relação a mim, nem ao menos se interessou em saber. Você desnudou meus sentimentos e me despiu de todo e qualquer amor próprio. É difícil amar por dois, oferecer a alguém o que não tenho nem para mim mesma. Tem noção do quão ridícula me senti vestindo-me apenas de esperanças?



Ele:
Não, eu não tirei nada de ti. Você que me deu seus sonhos, seus planos, seus carinhos, seus beijos, seus pensamentos, você — sem perguntar se eu queria. Eu só quero que você pare de me culpar por suas dores, por sua decepção, por seus desamores. Nunca quis te destruir, deixar-te em pedaços. Você me encaixou em seus vazios impreenchíveis e depois se sentiu incompleta quando eu te deixei. Como você pôde deixar alguém te destruir dessa forma? Não faça mais isso, moça. Você já é completa. 

Essa ideia de que alguém nos completa é besteira. Ou então todos vivemos pela metade? Os seus vazios fazem parte de você e nada nem ninguém pode preenchê-los, entenda, aceite, não chore. Precisamos desses espaços vazios em nós para não nos sufocarmos. Eu sempre soube muito de ti, tanto a ponto de te deixar. Vista-se, moça, e não tire mais a roupa — nem seu amor próprio — para qualquer um.  Você teve de mim a reserva de amor que guardo para as outras pessoas. O resto é meu.